Algumas coisas são inexplicáveis. Inacreditáveis mesmo.
Explico. Fui ontem à noite em uma cantata de Natal. Festinha de escola.
Programinha caseiro...
As apresentações foram acontecendo em sua normalidade, até
que no final... ops. O que é isso? Leonard Cohen!!! Isso mesmo. Da incredulidade
passei ao despeito: como se atrevem a cantar uma música do bardo canadense? Fã é
assim: não quer saber de dividir nada com ninguém...
Nas rodinhas de conversa,
sempre que alguém falava de Bob Dylan eu emendava: Leonard Cohen é melhor, mas
não é reconhecido! Cara de espanto geral! Ainda completava: a carreira de cantor
é secundária, ele é escritor, romancista. Ninguém conhecia e eu mantinha minha
fama de A Enciclopédia!
Ouvir Cohen é encarar o improvável. Minha primeira vez é do
tempo que assistia filmes. Esclareço. Não tenho mais paciência para
filmes-cabeça-europeus. Nem adolescência para blockbuster de super-heróis. Nada
mais infantil que marmanjo quarentão com camiseta do Capitão América. Voltando. Uma balada triste, sombria, uma canção de amor. Oito minutos de transe hipnótico.
Em seguida um pop-setentista-perfeito: The Future. Um clássico power-pop. Ouça.
Da surpresa ao encantamento.
Passei a vasculhar tudo. Discotecas Básicas, entrevistas,
reportagens... Na era pré-internet era assim: primeiro era feito um estudo
sobre o artista, depois partia para a compra. Lembrando que CD sempre foi um
artigo de luxo.
O esforço valeu a pena.
Comprei Cohen Live.
Outra bomba. Sem obviedades, sem concessões... com poucos refrões. Valsas, poesia, sensibilidade. Um disco
difícil. Arte Pura.
Já tinha ficado com raiva há uns dois anos quando um
mauriçola qualquer cantou Hallellujah no The Voice. Mas tudo bem. O grande
público merecia conhecer. Até que a música foi tema de um seriado da Globo. Qual
o nome? Não lembro. Tudo bem... o programa era legal, música de qualidade para
as massas, mas... e eu? Tenho que dividir com todo mundo? Fã é egoísta, quer que
seu artista preferido fique pobre... pra ninguém conhecer.
Deixei a chatice de lado e entendi o óbvio: Leonard Cohen em
uma cantata natalina escolar só podia ser milagre. Todos ali mereciam, mesmo
que a maioria absoluta não tenha a menor idéia de quem seja o autor... Não
importa. Talvez um ou dois daqueles adolescentes se interessem pela obra,
baixem o disco, leiam o livro... e assim segue a vida.
Longa vida a Leonard Cohen que se junta a dois gigantes. Vai cantar Hallellujah com Prince e David Bowie, vai embalar
festinhas de escola, programas de auditório, concurso de calouros (com nomes
bacanas é verdade... mas apenas isso,), vai ser pop... vai emocionar o mundo.